O risco de um acidente nuclear no Japão trouxe à tona o medo de que outras catástrofes se repitam. O desastre na usina de Chernobyl (Ucrânia), em 1986, é um dos exemplo mais comum nesse momento. E no Brasil? Já sofremos um grande acidente deste tipo?
Seguindo a escala da Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea), que divide os acidentes em nuclear (quando envolve uma usina ou instalação) e radioativo (quando envolve apenas material radiológico), o Brasil teve o pior caso do planeta na segunda classificação: o do césio 137, em 1987, em Goiânia.
Laércio Vinhas, diretor de Radioproteção e Segurança Nuclear do Conselho Nacional de Energia Nuclear (Cnen), que ajudou a elaborar a escala, explica que os acidentes nucleares são potencialmente mais perigosos, já que envolvem mais material radioativo. Nessa classificação, o pior caso até hoje é o de Chernobyl, que chegou ao grau sete.
No caso dos acidentes radioativos, o que ocorreu em Goiânia é o pior já registrado, com grau cinco. Ambas as escalas vão até sete.
Como ocorreu o acidente
Em 1985, o prédio do Instituto Goiano de Radiologia, que era emprestado da Santa Casa, foi abandonado com muitos equipamentos. Lá, três homens - Kardec Sebastião dos Santos, Wagner Mota Pereira e Roberto Santos Alves - encontraram uma máquina de radioterapia. Eles levaram o equipamento e tinham intenção de vender o material como ferro-velho.
Eles desmontaram parcialmente a máquina e a levaram para o ferro-velho de Devair Alves Ferreira, onde o equipamento foi desmontado de vez a golpes de marreta. Dentro havia uma bomba com 100 g de césio 137. Dias depois, o dono do local viu um brilho azul que vinha de uma cápsula de aço e levou o objeto para casa. Parentes, vizinhos e amigos visitaram para olhar o material e Devair e a mulher já apresentavam cefaleia e vômito, sintomas iniciais de contaminação.
O pó foi distribuído para o irmão de Devair e outras pessoas tiveram contato com o material. Ao notar que as pessoas próximas também estavam ficando doentes, a mulher levou um saco com o césio para a Vigilância Sanitária de Goiânia e disse que aquilo estava "matando" sua gente. Um físico foi chamado para verificar o caso e, na primeira vez que usou o equipamento para medir a radiação, achou que o aparelho estivesse quebrado, já que a máquina havia dado um índice muito alto.
O físico ainda teve que impedir que bombeiros, chamados pela vigilância sanitária, jogassem o material em um rio. A Cnen foi chamada e teve que usar um estádio para examinar as centenas de pessoas que estavam com suspeita de contaminação. A rua do ferro-velho e as casas foram interditas.
Pelo menos quatro pessoas morreram por causa da contaminação: Maria Gabriela Ferreira, 29 anos, Leide das Neves Ferreira, 6 anos - respectivamente a mulher e a sobrinha de Devair -, Israel Batista dos Santos, 22 anos, e Admilson Alves Souza - ambos funcionários do ferro-velho.
Centenas foram contaminados pelo césio 137 e as mortes causadas pelas doenças decorrentes da contaminação seriam de dezenas de pessoas nos mais de 20 anos após o acidente.